Enxaqueca (migrânea)

A enxaqueca, também conhecida como migrânea, é um tipo de cefaleia primária caracterizada por episódios recorrentes de dor de cabeça de intensidade moderada a forte, geralmente unilateral, pulsátil e associada a sintomas autonômicos e neurológicos. Trata-se de uma condição neurológica crônica que afeta entre 10 a 15% da população mundial, com maior prevalência em mulheres.

Dr. Caio Martins

7/23/20253 min read

A fisiopatologia da enxaqueca é complexa e multifatorial. A migrânea é considerada um distúrbio neurovascular primário com envolvimento de mecanismos neuronais e vasculares interdependentes. Os principais componentes fisiopatológicos incluem:

1. Ativação do Sistema Trigeminovascular

Acredita-se que o episódio de dor inicie com a ativação das fibras aferentes do nervo trigêmeo, que inervam os vasos meníngeos.

Isso leva à liberação de neuropeptídeos, como o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP), substância P, e neuroquinina A, resultando em vasodilatação meníngea, inflamação neurogênica estéril e sensibilização periférica.


2. Disfunção do Tronco Encefálico

Evidências sugerem um papel de centros cerebrais, como o núcleo dorsal da rafe e a substância cinzenta periaquedutal, na modulação da dor. Disfunções nesses núcleos podem levar à facilitação da transmissão da dor.

3. Depressão Alastrante Cortical (Cortical Spreading Depression - CSD)

Associada às enxaquecas com aura. Trata-se de uma onda de despolarização neuronal e glial que se propaga lentamente pelo córtex cerebral, causando alterações no fluxo sanguíneo cerebral e ativação do sistema trigeminovascular.


4. Fatores Genéticos e Epigenéticos

Há forte predisposição familiar, com variantes em genes associados às formas familiares de enxaqueca hemiplégica.


Fisiopatologia

Manifestações Clínicas

A enxaqueca pode se manifestar com ou sem aura. A classificação segundo a International Headache Society (ICHD-3) inclui:

1. Migrânea Sem Aura

Dor unilateral (embora possa ser bilateral)

Pulsátil

Intensidade moderada a forte

Agravamento por atividades físicas rotineiras

Duração de 4 a 72 horas (sem tratamento)

Sintomas associados: náuseas, vômitos, fotofobia e fonofobia



2. Migrânea Com Aura

Aura visual (escotomas, luzes piscantes, visão em túnel), sensitiva (parestesias), ou linguagem (disfasia)

Sintomas neurológicos reversíveis, geralmente precedendo a dor em até 60 minutos

A dor pode coincidir ou seguir a aura

Todos os outros sintomas da Enxaqueca sem aura

3. Formas Crônicas

Cefaleia por ≥15 dias/mês por >3 meses, sendo ≥8 dias com características migranosas

Todos os outros sintomas acima também podem estar presentes

Exames Complementares

Não são rotineiramente necessários, a menos que haja sinais de alerta, como:

Início súbito (“cefaleia em trovoada”)


Primeira cefaleia após os 50 anos

Alterações neurológicas focais persistentes

Mudança no padrão das crises

Cefaleia refratária ao tratamento

Sinais de hipertensão intracraniana

Quando indicados, geralmente optamos por exames de imagem, como Tomografia, Ressonância

Tratamentos

Tratamentos Não Farmacológicos

1. Educação e Estilo de Vida

Identificação e evitação de gatilhos: estresse, jejum prolongado, privação de sono, álcool

Regularidade no sono, alimentação e atividade física

2. Técnicas de Relaxamento e Terapias Cognitivo-Comportamentais

Biofeedback, meditação, mindfulness, yoga

3. Eliminação ou redução de alimentos que sejam gatilho de crise

Tratamentos Farmacológicos

Para as crises

Existem diversas opções de tratamento farmacológico para as crises, desde analgésicos simples à medicamentos direcionados aos alvos da Enxaqueca e Bloqueios de nervos (que também podem ser muito eficazes nas crises). Converse com o seu médico para avaliar o tratamento mais adequado para você. Exemplos:

Analgésicos

Antiinflamatórios

Corticóides

Bloqueios dos nervos da cabeça

Antagonistas dopaminérgicos

Bloqueadores de canal de cálcio

Para Prevenção de Crises

Existem muitas medicações, antigas e novas, para o tratamento preventivo da Enxaqueca.

Indicada quando:

≥4 crises/mês

Crises incapacitantes

Uso excessivo de analgésicos

Presença de aura prolongada

Classes principais:

Betabloqueadores

Antidepressivos tricíclicos

Anticonvulsivantes

Bloqueadores de canais de cálcio

Anticorpos monoclonais anti-CGRP

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Tratamentos Intervencionistas

1. Toxina botulínica tipo A

Bastante eficaz na redução da dor e do número de crises

Injeções a cada 12 semanas em pontos específicos da cabeça e pescoço

2. Bloqueios anestésicos

Eficazes em migrâneas refratárias, nas crises, ou até mesmo nos casos onde os medicamentos preventivos pararam de funcionar como antes. Procedimento minimamente invasivo, com alto potencial de benefício para quem sofre com migrânea.


Prognóstico e Impacto

A enxaqueca é uma condição debilitante que interfere significativamente na qualidade de vida e produtividade. Embora uma doença incurável, seu controle adequado permite à maioria dos pacientes ter uma vida funcional com baixa frequência de crises, ou as vezes até a "cura" da Enxaqueca - longos períodos sem dor ou sem crises, mas com tratamento correto. O diagnóstico precoce e a abordagem multimodal são fundamentais para o sucesso terapêutico.

  • Texto meramente educativo e informativo. Não se trata de indicação diagnóstica ou terapêutica de nenhum tipo. Procure sempre atendimento médico.